"Eu to aqui por todas as mulheres que morrem todos os dias por abortos inseguros" - Ato Pela Legalização do Aborto no Rio
Nesta sexta-feira, dia 22, milhares de pessoas se reúniram na fente da ALERJ para uma manifestação pela legalização do aborto. O ato seguiu até a Cinelândia com palavras de ordem e obteve apoio popular em diversos momentos. A Polícia Militar acompanhou o trajeto do ato de longe, e o protesto foi pacífico.
Ao chegar na Cinelândia, a Polícia Militar já demonstrava outra atitude, chegando a expulsar as/os manifestantes da escadaria da Câmara com truculência e formar um cordão de isolamento impedindo que a manifestação ocorresse ali. Diante disso, as presentes no protesto entoaram gritos pelo fim da PM e em memória de Marielle Franco e dos mortos nas favelas, incluindo recentemente um menino de 14 anos que ia para a escola na Maré quando foi alvejado pelo Caveirão.
O protesto foi realizado após a câmara dos deputados argentina aprovar o projeto de lei que legaliza o aborto depois de uma intensa pressão do movimento feminista local. O projeto lá segue para o Senado, onde também deve ser aprovado. O ato ocorreu para pressionar que o mesmo ocorra aqui.
Sarah Winter, uma militante contrária ao aborto legal, realizou um protesto contrário à manifestação na Candelária, cuja ideia inicial era a de abraçar a igreja, porém dado o baixo número de participantes não foi possível. As duas manifestações não se encontraram em momento algum.
Mas por que uma pauta como o aborto legal mobiliza tantas pessoas? Deixaremos as próprias manifestantes responderem.
"Depois da legalização do aborto na Irlanda, um dos países mais católicos do mundo, depois da aprovação no congresso da Argentina visando a legalização do aborto, aqui no Brasil temos uma longa jornada pela frente, mas muito confiantes e muito inspiradas pelo exemplo da militância lá no exterior. E aqui no Brasil temos uma situação muito complicada para as mulheres pretas e pobres, que são presas e criminalizadas pelo aborto. Dentro do SUS tem pessoas que, por ideologia, denunciam essas mulheres que estão quase morrendo por aborto, que chegam ao hospital morrendo por aborto, e infringindo o código de ética do próprio profissional de saúde, eles denunciam essas mulheres, que vão presas. A defensoria pública do Rio de Janeiro já identificou que a maior parte das mulheres presas são negras e pobres. Quer dizer, as mulheres ricas já fazem o aborto normalmente, sem serem criminalizadas, então se trata de um puro controle social e político das mulheres no Brasil, e o que a gente quer é a liberdade. A gente não é contra a religião, a gente só é a favor da autonomia e da liberdade das mulheres. Viva as mulheres!" - disse uma manifestante.
Essa fala explica bem como a proibição do aborto é usada como instrumento de dominação de classe para as mulheres já marginalizadas pelo sistema capitalista.
"Eu to aqui por todas as mulheres que morrem todos os dias por abortos inseguros" - disse uma outra ativista.
Golpe às mulheres!"Primeiramente, o Estado é laico, então já é um absurdo a gente ter uma bancada evangélica tão forte negando esse direito da mulher de decidir sobre o corpo dela. Segundo que é uma questão de saúde pública. O aborto, legalizado ou não, está acontecendo. A gente só precisa proteger as mulheres que estão morrendo, as mulheres pobres, as mulheres negras, porque o Estado deve garantir a segurança, não deixar essas mulheres morrerem dessa forma."
Dia 08 de de Novembro as mulheres de todo o Brasil tiveram que engolir mais uma vez uma investida da bancada evangélica, que através de uma brecha, conseguiu implantar na constituição a emenda constitucional chamada 'PEC 181' que criminalizaria ainda mais o aborto, sob as formas que já eram garantidas por lei. Antes da proposta ser aprovada, um aborto legal poderia ser realizado se: oferecesse risco à saúde física da mulher; o bebê nascesse anencéfalo (sem cérebro); e se a fecundação fosse resultado de um estupro.
A brecha (conhecida como "cavalo de Troia") que os fundamentalistas cristãos encontraram para inibir esse resguardo à mulher baseava-se no entendimento que "o que garante a igualdade de todos perante a lei é a inviolabilidade do direito à vida". Tão reduzido, esse pretexto além de desonesto, nega o embasamento científico sobre o assunto, uma vez que o feto até os 3 meses de vida não tem sequer consciência de si. Portanto, resguardar a saúde da criança e da mulher em questão, passa a ser considerado assassinato.
Uma vez que o Estado é laico, e a fé e conduta são questões morais, a escolha de abortar ou não é sempre subjetiva. Visto isso o Estado não pode interferir dessa forma na autonomia da mulher sobre seu próprio corpo. Eis então a narrativa que a esquerda não pode se desprender: Falar de aborto é falar de saúde pública. E avante à luta das mulheres pela sua emancipação.
Sobre a PEC 181, ver também: https://midiaindependente.org/?q=node/461