A Máfia dos Transportes e a Criminalização dos Movimentos Sociais
Diversas manifestações contra o aumento dos serviços de transporte público inauguraram o ano no Brasil. Aumentos abusivos que tem como fim o enriquecimento das empresas de transporte, em detrimento dos trabalhadores que não tiveram seus salários aumentados.
Já em agosto de 2011, Teresina, Piauí, contou com protestos que conseguiram barrar o aumento através da ação direta do povo, mas logo no início deste ano, a máfia dos transportes aproveitou o recesso das férias para reajustar as passagens em 10,5%, o que gerou novos protestos e a ação truculenta da polícia militar. Em Porto Alegre, Belo Horizonte e Vitória os estudantes também realizaram protestos contra os aumentos das passagens. No Rio de Janeiro, o aumento da passagem dos ônibus para R$ 2,75 gerou também várias manifestações pautadas na ação direta.
Ainda esse ano, a Assembléia Legislativa (Alerj) concedeu à concessionária Barcas S/A, que opera o trajeto Rio-Niterói, um reajuste de R$ 2,80 para R$ 4,50 no valor da tarifa, o que representa um aumento abusivo de 61%, algo jamais visto antes. A empresa deve quatro milhões de reais à cidade de Niterói, além de prestar um serviço sucateado. Diariamente os trabalhadores tem que enfrentar embarcações sem ar condicionado, sujeitando os passageiros a um excessivo calor, coletes salva vidas vencidos, enormes filas, falta de informação, atrasos, além de acidentes sistemáticos.
A justificativa para o aumento abusivo é de que haveria um desequilíbrio econômico e financeiro no contrato com a concessionária responsável pelo serviço de barcas. A Secretaria Estadual de Transportes calculou que haveria a necessidade de um reajuste de cerca de 60%! Ou seja, o Governo do Estado e as empresas privadas fazem seus acordos e a conta é o povo que tem que pagar.
Um amplo movimento formou-se, então, na luta contra o aumento, chamando um grande ato, com ação de “pula roleta”, para o dia 1º de março. Várias pinturas de stencil, convocando para o ato, foram feitas por Niterói, além de chamadas cotidianas na Praça Araribóia. No entanto, o aparato repressivo do Estado logo foi acionado para defender os interesses da empresa. Uma série de intimações foram realizadas pela 76 ª DP, que já possui um dossiê feito pela Barcas S/A com os perfis dos manifestantes. Depois que um vídeo foi postado no YouTube, convocando as pessoas ao “pulaço”, e colocando a questão da legitimidade da desobediência civil, um dos autores do vídeo, Felipe Xavier, também foi intimado pela polícia a comparecer na delegacia. O Tribunal de Justiça também entrou com um processo contra a empresa Google para que retirasse do canal o referido vídeo, sob pena de pagar uma multa de 15 mil reais diários. De todas as formas o Estado e a Justiça burguesa tomam partido das empresas capitalistas contra os trabalhadores.
No dia da manifestação, os Centros Acadêmicos de Ciências Sociais e de Filosofia da UFF foram invadidos pela Polícia Militar, que em tese nem ao menos teria o direito de entrar no campus. Sabemos que a presença da polícia no campus nunca representou uma melhora da segurança, e sempre serviu à repressão e abuso aos alunos e ao movimento estudantil. Lembremos da USP, cujos casos de violência aos estudantes foram constantes, contando até com episódios de estupro por parte de policiais. A invasão da policia em espaços universitários deixa ainda mais claro o seu papel na sociedade, reprimindo o povo pobre e promovendo verdadeiros genocídios nas comunidades e nas remoções de habitações populares. Isso só reforça o fato de que é inviável qualquer pretensão de se disputar a força policial para causas populares, é uma instituição que estará sempre contra os trabalhadores. Polícia esta que contava com um contingente maciço para reprimir a manifestação do dia 1º, composto pela tropa de choque e até helicópteros.
As manifestações, no entanto, contam cada vez mais com a presença de grupos e partidos políticos que buscam oportunamente se promoverem. Em ano eleitoral, políticos profissionais como o vereador Leonardo Giordano (PT) tentam transformar os atos em verdadeiros palanques eleitorais. A tática política defendida por estes grupos é a de se fazer um abaixo-assinado para ser encaminhado ao Ministério Público, indo na contramão de uma tendência nacional que tem optado pela ação direta. Somos a favor de nos utilizarmos de todos os mecanismos possíveis para travar a luta, contudo devemos garantir a autonomia dos movimentos que vem se construindo e que ainda continuarão dando combate nas ruas.
Sabemos que uma ação impensada, tomada por uma minoria dita revolucionária, que se coloca à frente do povo também não é a resposta. Uma ação deslocada das bases, prematura e mal organizada, por mais bem intencionada que seja, pode prejudicar as lutas por transformação social dos trabalhadores. Por isto, é importante estarmos lado a lado com os trabalhadores, nem à frente, nem para trás. A radicalização do movimento se dará como resultado de um trabalho de base realizado no dia a dia, não pela ação de uma vanguarda iluminada.
Devemos garantir a participação dos diversos setores do povo na reflexão e construção da luta pela revogação do aumento das passagens e em defesa de um transporte público de qualidade, e não a serviço dos interesses do mercado e das empresas capitalistas; defender a ação direta como um caráter militante capaz de garantir o protagonismo popular e se opor aos políticos e militantes profissionais que se colocam como os únicos capazes de tomar todas as decisões; enfim, forjar na luta um povo forte que arranque as mudanças e tome às rédeas de seu próprio destino.
É em torno desses objetivos que nos organizamos cotidianamente para que nesta segunda-feira, dia 5, retomemos o trabalho de base e a mobilização nas barcas.
Antonio Felipe "Kiko" Machado
Movimento de Ação Direta - MAD
Organização Popular/RJ
Links das Lutas:
Comitê Contra o Aumento das Passagens - Rio de Janeiro
Comentar